quarta-feira, 11 de abril de 2012

Análise ao Poema "Num Bairro Moderno"

  • O poema "Num Bairro Moderno" é exemplificativo de um dos traços característicos da poesia de Cesário Verde - a deambulação. O poeta percorre o bairro enquanto se dirige para o emprego - " (...) Eu descia, / Sem muita pressa, para o meu emprego," (est. III, vv. 2-3) e é o seu olhar que, como uma "câmara", vai "focando" vários planos: a "casa apalaçada", os "jardins" que se estendem ao longo da "larga rua macadamizada" (est. I), os "rez-de-chaussée" cujas persianas que se abrem deixam ver pormenores do interior das casas - "quartos estucados", "papéis pintados", "porcelanas" (est. II). Note-se que tanto estes pormenores do espaço interior como as referências anteriores a elementos do espaço exterior sugerem bem-estar, o conforto que se vive neste bairro moderno e burguês; o poeta explicita-o ao introduzir com um comentário pessoal a terceira estrofe - " Como é saudável ter o seu conchego / E a sua vida fácil!" Esta ideia de conforto é sugerida não só pelas referências objectivas como pela linguagem expressiva utilizada, nomeadamente por verbos e adjectivos: "com brancuras quentes" - sinestesia, "Rez-de-chaussée repousam sossegados" - hipálage - transfere-se para as casas o ambiente de tranquilidade que se vive no seu interior e que é acentuado pela associação pleonástica do verbo "repousar" e do adjectivo "sossegado", "Reluzem, num almoço, as porcelanas."


  • O brilho que emana das loiças é um dos elementos que confere visualismo a esta descrição. O motivo do olhar domina a composição: "Matizam", "fere a vista", "Reluzem", "Notei", "examinei-a", são elementos lexicais que confirmam a importância que a percepção visual detém no poema. Nas estrofes IV e V o poeta refere-se à vendedeira como se o seu olhar se fixasse sobre uma imagem da qual o poeta destaca aquilo que visualmente o impressiona - "uma rapariga / Que no xadrez marmóreo duma escada, / como um retalho de horta aglomerada, / Pousara, ajoelhando, a sua giga." É de notar o forte contraste visual (sugerido) entre o branco e o negro, dispostos em xadrez, e o colorido das frutas e legumes que estão dentro da cesta. A esta associam-se outras sensações. Ainda na quinta estrofe é o som que vem completar o quadro -"ressoam-lhe os tamancos"; na oitava estrofe a associação de sensações - sinestesia- é o processo através do qual o poeta transmite a sua visão impressionista da realidade - "Bóiam aromas, fumos de cozinha;" (olfacto), "Com a cabaz às costas, e vergando, / Sobem padeiros, claros de farinha;" (visão), "E às portas, uma ou outra campaínha / Toca, frenética, - hipálage - de vez em quando." (audição).
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